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Os Livros em Liberdade
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Quem tem a paixão pelos livros nem sempre entende porque razão eles não fazem parte da vida de tantos portugueses. Pode aceitar-se que a casa é o rosto e a alma de uma pessoa. A minha está cheia de livros, diria mesmo atravancada. Às vezes dá-me vontade de libertá-los, mas receio perdê-los de vista, coisa que nenhuma paixão consente. O objecto de desejo tem de estar à vista e à mão.
Ora, a Feira do Livro n Parque Eduardo VII permite-me uma vez por ano concretizar esse desejo: olhar os livros em liberdade sem os perder de vista, tê-los ali à mão de semear, pelo que lá volto em peregrinação cada ano que passa. Mato dois coelhos de uma cajadada: vou ao parque, que nunca visito noutras ocasiões e que durante o dia me surge agradável; e descubro os livros em liberdade ao encontro de tanta gente que não entra em livrarias, não vai a bibliotecas e, quem sabe, nem sequer lê.
A feira no parque é uma festa, aberta, ao ar livre, que convida os passantes a espreitar esse objecto cada vez mais estranho em que se está a transformar o livro perante a concorrência de toda a oferta multimédia. Fechá-lo num grande armazém, mesmo que lhe chamem FIL, é aprisioná-lo de novo, é remetê-lo para um «ghetto», onde se vão movimentar quase exclusivamente os profissionais da indústria e comércio livreiros. Se este é o destino que lhe querem impor é mais um golpe no futuro do livro e menos razões para voltar ao Parque Eduardo VII. Um país sem livros é um país sem futuro.
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[in Os Livros no Parque, editoras Afrontamento, Antígona, Assírio & Alvim, Climepsi, Cotovia, Meribérica-Liber, Relógio D’Água e Teorema, 2004]
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