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“Ah! Jantámos deliciosamente, sob os auspícios do Melchior – que ainda depois, provido e tutelar, nos forneceu o tabaco. E, como ante nós se alongava uma noite de monte, voltámos para as janelas desvidraçadas, na sala imensa, a contemplar o sumptuoso céu de Verão. Filosofámos então com pachorra e facúndia.
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Na Cidade (como notou Jacinto) nunca se olham, nem lembram os astros – por causa dos candeeiros de gás ou dos globos de electricidade que os ofuscam. Por isso (como eu notei) nunca se entra nessa comunhão com o Universo que é a única glória e única consolação da Vida. Mas na serra, sem prédios disformes de seis andares, sem a fumaraça que tapa Deus, sem os cuidados que, como pedaços de chumbo, puxam a alma para o pó rasteiro – um Jacinto, um Zé Fernandes, livres, bem jantados, fumando nos poiais de uma janela, olham para os astros e os astros olham para eles. Uns, certamente, com os olhos de sublime imobilidade ou de sublime indiferença. Mas outros curiosamente, ansiosamente, com uma luz que acena, uma luz que chama, como se tentassem, de tão longe, revelar os segredos, ou de tão longe compreender os nossos…
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– Oh Jacinto, que estrela é esta, aqui, tão viva, sobre o beiral do telhado?
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– Não sei… E aquela, Zé Fernandes, além, por cima do pinheiral?
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– Não sei.
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Não sabíamos. Eu, por causa da espessa crosta de ignorância com que saí do ventre de Coimbra, minha Mãe Espiritual. Ele, porque na sua Biblioteca possuía trezentos e oito tratados sobre Astronomia, e o Saber, assim acumulado, forma um monte que nunca se transpõe nem se desbasta. Mas que nos importava que aquele astro além se chamasse Sírio e aquele outro Aldebarã? Que lhes importava a eles que um de nós fosse Jacinto, outro Zé?”
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[Eça de Queiroz, de A Cidade e as Serras]
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