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– Caralho – pedi eu ao Zé Manel –, pela tua saúde tira o velho das unhas destes cornos. São os netos dos cabrões que jogavam pedras no Rato ao Gomes Leal, são os impotentes que se queixam que neste país só se faz merda e que quando aparece alguém que não faz merda desatam a rosnar de fúria e de ciúme diante da tesão alheia por sentirem o trapo murcho nas ceroulas, por não serem capazes, por não serem definitivamente capazes de enconar a vida.
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– Este é o António Lobo Antunes – disse o Zé Manel na sua voz afectuosa e doce que transformava as palavras em ternos bichos de feltro. Trazia Le Monde consigo como os tipos do século XIX as bengalas de castão de prata, e eu pensava Le Monde é a gravata dele ao olhar-lhe a roupa lançada com descuido sobre o corpo pequeno, a pulseira de cabedal, o cabelo escorrido sobre a gola da camisa.
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O escritor Luiz Pacheco oscilou ligeiramente nas pernas inseguras: o seu orgulho pungente, a sua insuportável ironia, reduziam os pénis dos impotentes a engelhadas coisinhas moles de mijar, enroladas nas calças numa vergonha de lombrigas. Uma farripa descolorida oscilava como uma pluma contra os azulejos da parede. Deitou a gabardine para trás, desembaraçou-se dos sacos e esbofeteou-me a cara, com ambas as palmas, num júbilo divertido:
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– Ah rapazinho.
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E éramos os três os únicos sujeitos vivos naquele cemitério de tremoços.”
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[António Lobo Antunes, de Conhecimento do Inferno, 1980]
21.1.08
A noite em que conheci o escritor Luiz Pacheco
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1 comentário:
não há palavras
para quem quer que sejas
ou o contrário
não há palavras
mas podes trocá-las
sempre comigo
neste antro virtual
e delicioso
hoje
não há palavras
apenas
uma lágrima
furtiva
e bela
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