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O Maio de 68 tem sido recordado em jornais, revistas, televisões, blogs, mas curiosamente não me apercebi de muitas referências a um livro que me parece fundamental sobre este período: trata-se de Maio e a Crise da Civilização Burguesa de António José Saraiva.
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António José Saraiva, na altura a viver em Paris, acompanhou empolgadamente os acontecimentos, publicando pouco depois (em 1969) este livro extraordinariamente lúcido e inteligente.
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É um livro “constituído por um «diário», por notas e por breves ensaios inspirados por aquilo que no título se designa por «crise da civilização burguesa»” como refere o autor no posfácio.
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A maior parte do livro é de facto constituída pelo diário “de João Cândido” que vai retratando e analisando o que de principal aconteceu em Paris entre 23 de Maio e 30 de Julho de 68.
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Por exemplo, no dia 27 de Maio (há precisamente 40 anos) escreveu:
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“O que é que um marxista ortodoxo vindo de Portugal pode perceber disto? Deve ficar completamente às aranhas, emitindo juízos contraditórios como um louco. «A quoi ça rime?» Ataques violentos aos sindicatos e ao PC nos anfiteatros. Como é possível? Não é o PC, por definição, a vanguarda da classe operária e a classe operária a classe revolucionária? E como é que toda aquela literatura excluída do «socialismo científico», enterrada como «ultrapassada», «utópica», etc., reaparece na actualidade? Anarquismo (mas o Marx não liquidou o anarquismo?), federalismo, fourierismo, etc.? Como, como? E as «leis da história» não funcionam? Os estudantes não são os «filhos da burguesia»? Não será tudo isto uma acção de provocadores ao serviço da burguesia?”
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Além do diário o livro tem uns pequenos ensaios e um longo posfácio, de onde retirei este excerto, ainda mais pertinente hoje do que há 40 anos:
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“A civilização burguesa já só nos oferece a perspectiva de haver cada vez mais máquinas para fabricar mais objectos e distribuir mais moeda para os comprar; cada vez mais rapidez para percorrer rectiliniamente a distância entre dois sítios cada vez mais iguais; cada vez mais precisão nos gestos e tempo das pessoas para poderem engrenar com as máquinas; cada vez mais igualdade entre indivíduos condicionados em série; cada vez menos imprevisto, menos gritos, menos lágrimas. E também cada vez mais psiquiatras para «normalizar» os homens rebeldes à norma uniforme. Estes homens, cada vez mais padronizados, fazem cada vez mais o que os economistas, os estatísticos, os sociólogos, os psicólogos, os especialistas de marketing, esperam que eles façam.”
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Maio e a Crise da Civilização Burguesa foi reeditado em 2005 pela Gradiva, integrado nas suas obras completas.
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António José Saraiva, na altura a viver em Paris, acompanhou empolgadamente os acontecimentos, publicando pouco depois (em 1969) este livro extraordinariamente lúcido e inteligente.
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É um livro “constituído por um «diário», por notas e por breves ensaios inspirados por aquilo que no título se designa por «crise da civilização burguesa»” como refere o autor no posfácio.
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A maior parte do livro é de facto constituída pelo diário “de João Cândido” que vai retratando e analisando o que de principal aconteceu em Paris entre 23 de Maio e 30 de Julho de 68.
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Por exemplo, no dia 27 de Maio (há precisamente 40 anos) escreveu:
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“O que é que um marxista ortodoxo vindo de Portugal pode perceber disto? Deve ficar completamente às aranhas, emitindo juízos contraditórios como um louco. «A quoi ça rime?» Ataques violentos aos sindicatos e ao PC nos anfiteatros. Como é possível? Não é o PC, por definição, a vanguarda da classe operária e a classe operária a classe revolucionária? E como é que toda aquela literatura excluída do «socialismo científico», enterrada como «ultrapassada», «utópica», etc., reaparece na actualidade? Anarquismo (mas o Marx não liquidou o anarquismo?), federalismo, fourierismo, etc.? Como, como? E as «leis da história» não funcionam? Os estudantes não são os «filhos da burguesia»? Não será tudo isto uma acção de provocadores ao serviço da burguesia?”
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Além do diário o livro tem uns pequenos ensaios e um longo posfácio, de onde retirei este excerto, ainda mais pertinente hoje do que há 40 anos:
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“A civilização burguesa já só nos oferece a perspectiva de haver cada vez mais máquinas para fabricar mais objectos e distribuir mais moeda para os comprar; cada vez mais rapidez para percorrer rectiliniamente a distância entre dois sítios cada vez mais iguais; cada vez mais precisão nos gestos e tempo das pessoas para poderem engrenar com as máquinas; cada vez mais igualdade entre indivíduos condicionados em série; cada vez menos imprevisto, menos gritos, menos lágrimas. E também cada vez mais psiquiatras para «normalizar» os homens rebeldes à norma uniforme. Estes homens, cada vez mais padronizados, fazem cada vez mais o que os economistas, os estatísticos, os sociólogos, os psicólogos, os especialistas de marketing, esperam que eles façam.”
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Maio e a Crise da Civilização Burguesa foi reeditado em 2005 pela Gradiva, integrado nas suas obras completas.
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