31.7.09

DE PROFUNDIS AMAMUS
.
Ontem
às onze
fumaste
um cigarro
encontrei-te
sentado
ficámos para perder
todos os teus eléctricos
os meus
estavam perdidos
por natureza própria
.
Andámos
dez quilómetros
a pé
ninguém nos viu passar
excepto
claro
os porteiros
é da natureza das coisas
ser-se visto
pelos porteiros
.
Olha
como só tu sabes olhar
a rua…..os costumes
.
O Público
o vinco das tuas calças
está cheio de frio
e há quatro mil pessoas interessadas
nisso
.
Não faz mal…..abracem-me
os teus olhos
de extremo a extremo azuis
vai ser assim durante muito tempo
decorrerão muitos séculos antes de nós
mas não te importes
não te importes
muito
nós só temos a ver
com o presente
perfeito
corsários de olhos de gato intransponível
maravilhados…..maravilhosos…..únicos
nem pretérito nem futuro tem
o estranho verbo nosso
.
[Mário Cesariny, in A Perspectiva da Morte: 20 (-2) Poetas Portugueses do Século XX (selecção e prefácio de Manuel de Freitas), Assírio & Alvim, 2009]

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