20.7.07

& etc n.º 2

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«Pena é que muitas vezes não passe do primeiro número» – disse à nossa reportagem um leitor do & etc nº1. Sabemos de outros que sem pena alguma apostaram na não-saída deste nº2. Azar: perderam. Outra nossa leitora, proprietária de um estabelecimento de modas, declarou que «a revista é muito cara porque, pelo mesmo preço, o «Século Ilustrado» é muito mais divertido e muito mais bonito», opinião que não nos atrevemos a contestar. Resumindo: a sermos masoquistas, já teríamos matéria para bem amargos prazeres! Críticos de entre Monte-Carlos e Brasileiras da comarca não chegaram contudo à unanimidade: se uns detestaram o papel, outros o acharam «excelente, à inglesa»; se houve quem designasse a capa do Manuel Baptista como «bordado», «pouco espectacular», «paupérrima», também houve quem a considerasse «extremamente elegante», «de um grafismo lírico e subtil», etc.; a arrumação gráfica, essa provocou igualmente aplausos e assobios – uns & outros tremendamente justificados; o «conteúdo», bem, sobre o «conteúdo» aspas aspas e reticências. Não temos de que nos queixar: bem sabemos o terreno que pisamos & de como é difícil ser pároco nesta freguesia. Na consciência bastante das limitações e erros próprios – que não passa por gargantas belicosas e opiniões em absoluto desfasadas do conhecimento do real em que assentamos – teimamos num trabalho de facto experimental, número a número sujeito a vicissitudes de variada natureza – e às correcções técnica e humanamente possíveis, já que não podemos perseguir a «perfeição» nem sabemos, em português ou esperanto, o que isso seja. Digamos: tentamos apenas aproximarmo-nos do projecto inicial. No interim (e daqui prometemos o & etc nº3 – que ele há umas centenas de assinantes a pagar ao ano), damos conta de algumas opiniões que pudemos recolher na rua sobre o lançamento do famigerado & etc nº1.
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«NEM UM NIQUINHO A VERMELHO»
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– Comprei o & etc por me interessar por assuntos culturais. Não, não conhecia ninguém nem ninguém me tinha ainda falado no jornal (José Carlos Vicente, 27 anos, empregado de escritório). Não lhe posso dar uma opinião, pois comprei-o agora. Parece-me com piada. Para já, posso dizer-lhe que gosto da apresentação. Parece não sei quê, mas tem piada.
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– Comprei-o na quarta-feira, quando saiu (Maria Gabriela Ferreira, 32 anos, professora). Já li alguns artigos, mas ainda não tenho uma impressão definida. A ideia parece gira. Há é umas coisas que não percebi bem, certas críticas. Podia (e devia) ser mais claro, mais directo, percebe…
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– Ponha lá no jornal que gosto imenso destas coisas culturais. Pena é que muitas vezes não passe do primeiro número (Ricardo Guerreiro, 65 anos, funcionário público reformado). O sr. diz que este vai ser diferente… Oxalá, oxalá… Nos meus quinze anos, também fiz coisas dessas. No liceu. Pelo menos o primeiro número deste género de revistas ou jornais compro sempre.
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– Comprei-o agora mesmo, ali na tabacaria do café (anónimo, aparentando 25 anos, barba crescida, óculos graduados) e para ser franco… acho tudo muito chato. Nem um niquinho a vermelho na capa.
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– Em pobre, gosto do aspecto. Não é piroso. Paginação acima da média dos jornais portugueses, muito acima mesmo. Principal defeito, quanto a mim: ausência de uma informação quantitativa completa, digamos, relativamente completa (João José Ramos, Faculdade de Letras), onde coubessem estatísticas, etc. Ainda não li as críticas com a necessária atenção. «Pata na poça», um achado.
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«DEVIA HAVER ZILHÕES»
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– Que poderia dizer? (Wilton Fonseca, 24 anos, brasileiro, jornalista e estudante de Filologia Românica). É sempre salutar este tipo de magazine, como o próprio magazine se define; devia haver zilhões de publicações do género, que são sempre uma espécie de janela aberta por onde entra um pouco de ar fresco no meio de toda uma imprensa nacional tradicionalista e tradicionalizante. Acho que ele não se distingue propriamente, nem pela clareza dos artigos, nem pelo aspecto gráfico, mas por ser alguma coisa diferente do que aparece por aí. Há um cepticismo geral em relação a este tipo de publicações, cepticismo este que tem origem nas possibilidades económicas de sobrevivência. Quanto a mim, isso não é importante. Digo-lhe que pretendo fazer uma assinatura e ler enquanto houver…
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– Lamento o desaparecimento do «& Etc.» do Jornal do Fundão. O novo, como vê, comprei-o agora. Devo esclarecer que sempre fui e continuarei a ser irreverente, contestatária (se quiser), em relação a qualquer estado de alma fanático, e, sendo agressiva, posso não estar de acordo com o outro tipo de agressividade ou com a agressividade dos outros. E qualquer forma, e com base na independência que tenho procurado manter, divirto-me, distraio-me, aprendo, tiro as minhas conclusões, dou o meu acordo, discordo, insulto mentalmente o jornalista, mas isto é saudável, e, por isso mesmo, vou passar (ou continuar) a comprar o «& etc» (Fernanda Botelho, escritora).
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«DO PAÍS EM QUE SITUA»
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– A uma revista que pretende ser sobretudo actuante pode exigir-se, além de um bom lote de colaboradores de ideologia aproximada, a preocupação de entrar em todos os campos da actividade humana, de forma a poder criar um sentido de desalienação e comunicação possíveis, num ritmo de trabalho paralelo. Parece-me que o primeiro número de & etc se debruça de mais sobre fenómenos culturais – livros, textos acerca de cinema… –, que, embora de grande importância, não esgotam as possibilidades da revista (António Viana, estudante).
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– O que me parece é que há uma preocupação determinante dos intelectuais portugueses de escrever dentro de um estilo peculiar das escolas literárias da Outra Europa, que não esta (Cartaxo e Trindade, professor assistente de Filologia Românica). Creio, a priori, que uma revista deste género deverá ter em conta a situação sócio-económica do País em que se situa, e, infelizmente, encontro em muitas revistas congéneres uma verborreia que não se adapta em nenhuma circunstância ao contexto cultural português. Cairá o & etc nisto? Forçosamente, tal dependerá de quem fizer o magazine.
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– Tenho vendido algumas… sete, sim, sete (D. Maria João, com tabacaria em Benfica). Pedi mais ao distribuidor. Mas sabe, isto acontece com tudo o que sai pela primeira vez. Ali o senhor do 3º esquerdo não deixa escapar nada. Só quer primeiros números… Se ele não compra outros jornais? Bem… Pois. Compra «A Bola» e, às vezes, o «Popular».
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ENTRE MORTOS E FERIDOS
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– Achei muito bem. No entanto, considero a paginação um bocado maçuda (Pedro Tamen, poeta). Não quer dizer que tenha ilustrações a menos. Mas tem de certeza texto a mais. É pouco agradável de ler, do ponto de vista gráfico. A secção a pata na poça devia estar mais desenvolvida.
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– Este exemplar não é meu, foi uma amiga quem mo emprestou ontem (Maria Carla Formosinho, estudante de Letras, na Grã-Fina). Ainda não li tudo, mas posso dizer-lhe que não estou a gostar muito. Preferia a revista «Crítica», que, infelizmente, acabou. Tinha artigos muito mais sérios, com uma visão baseada nas modernas tendências da crítica. Vocês pretendem «gozar». Magazine? Está bem, está bem, mas parece-me haver uma falta de preparação ao tratar certos temas (o cinema, a crítica de livros). Nós precisamos é de coisas sérias, bem estruturadas.
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– Não respondo (anónimo, cerca de 20 anos): só lhe digo que comprei isto por acaso e não o deito para o lixo porque me custou sete mil e quinhentos.
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– Leio, compro, porque o que é preciso é barulho; entre mortos e feridos alguém há-de escapar (João Balbino, pacifista). Acho piada a estes bonecos, e só é pena que a revista tenha tão poucos. Também costumo comprar aquela revista espanhola, «Triunfo», e V. está a ver, eles trazem sempre umas coisas porreiras que fazem a gente rir e pensar ao mesmo tempo. O poppe a galoppe, não sei bem de quem se trata, quer dizer, não costumo ler, mas está muito bem apanhado. Façam mais, mas com bonecos.
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[in & etc nº2, 31/01/1973]

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